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Guest Post: Lóbi e revisão constitucional

por Alda Telles, em 08.09.10
É com muito gosto que publicamos este "Guest Post", assinado pelo maior defensor do lóbi profissional em Portugal, Martins Lampreia.O que tem a ver o Lóbi com a possível revisão constitucional que actualmente faz parte da agenda politica? A priori nada. Na prática muita coisa.Comecemos por relembrar o conceito europeu de Lóbi. Quem está minimamente familiarizado com este assunto, sabe que o Lóbi não é mais do que a defesa dos interesses de um determinado sector da sociedade perante os Poderes Públicos. Tal como o Advogado defende os interesses dos seus clientes perante o Poder Judicial (responsável pela aplicação da Lei), o Lobista, defende os interesses dos seus clientes, mais a montante perante os Poderes Legislativo e Executivo; -Isto é perante quem faz as leis.Em qualquer sistema democrático, os lóbis são legitimados e representam uma importante peça da engrenagem da Democracia, funcionando como uma espécie de contra peso dos Poderes Políticos.Costuma-se dizer que os Lobistas são o braço armado da Sociedade Civil, de quem defendemos interesses perante os poderes instituídos.A nível da União Europeia tanto a Comissão como o Parlamento Europeu não só reconhecem a legitimidade dos grupos de interesses (isto é dos Lóbis) como consideram a sua existência altamente vantajosa e necessária, ao equilíbrio democrático e ao bom funcionamento das instituições.Por essa razão os cerca de 5000 Lobistas acreditados no Parlamento fazem parte integral da “paisagem” e circulam dentro da instituição com a mesma liberdade que os Eurodeputados, assistentes, funcionários ou jornalistas.Claro que o exercício dessa profissão tem de ser feito com grande profissionalismo e está sujeito a apertadas regras de ética, e de transparência e sob um rigoroso controlo; nem poderia ser de outra forma.O que nos leva á questão recorrente: se o Lóbi traz tantas vantagens, porque não é reconhecido e regulamentado em Portugal? (e já agora em Espanha também?)Na verdade é intrigante que no fim de 36 anos de Democracia e de 24 anos integrados na União Europeia, a actividade ainda tente funcionar com os requisitos do pré-25 Abril, isto é através do pedido, da cunha do compadrio, etc…, também é verdade que ao longo destes últimos anos houve por parte de alguns governantes umas tímidas tentativas de discutir o assunto, no âmbito de uma maior transparência e do combate á corrupção. Mas nenhuma iniciativa teve qualquer seguimento.Porque será então que o Lóbi não é legalizado, nem controlado, no nosso País?Já me colocaram varias vezes essa pergunta e, pessoalmente, vejo quatro razões principais na origem desta situação.a)    Apesar de termos sido dos poucos países a traduzir para o dicionário em 2002, a palavra original “Lobby” para “Lóbi” e “Lobbyist” para ”Lobista”, a verdade é que não temos, como os países nórdicos, nenhuma tradição na defesa de interesses da Sociedade Civil perante os poderes instituídos. Nesses Países, questionar os eleitos é um direito que o sistema democrático confere a qualquer cidadão. A nossa estrutura mental ainda está formatada pela influência de meio século de ditadura, e mesmo uma geração após o 25 Abril, ainda se aborda com um laivo de “servilismo”, um distanciamento respeitoso, e até um certo receio os detentores dos cargos Públicos, esquecendo o cidadão que foi ele, com o seu voto, que os elegeu. Com esta forma de estar como pano de fundo, ousar abordar os eleitos para propor seja o que for, não é uma pratica corrente para a maioria dos grupos de interesses.b)    Os Media, terão também a sua quota-parte de responsabilidade, dado que até há bem pouco tempo (já não é verdade desde há uma meia dúzia de anos) sempre que se falava de Lóbi, Lóbis ou Lobistas, era inevitavelmente de forma pejorativa, como sinónimo de uma actividade obscura, marginal e pouco recomendável.Isso ajudou em muito a criar na opinião pública a conotação negativa que ainda envolve a actividade, identificando-a, erradamente, com o tráfico de influências, a manipulação ou até corrupção.c)    Por outro lado, os grandes grupos económicos presentes em Portugal, e que poderiam devido à sua influência alterar a situação, tão pouco se mostraram muito interessados em mudar seja o que for, visto que do seu lado nunca tiveram qualquer dificuldade de acesso aos órgãos do Poder. Como se pode imaginar qualquer responsável de um desses grupos, ou das nossas 100 maiores empresas, sempre que quiser falar com um governante, um deputado ou um politico influente, bastar-lhe-á pegar no telefone e faze-lo directamente. Para quê alterar esta situação confortável, criar novas regras, alargar o leque de influência a outros sectores e nomeadamente às PME’s?d)     Por último, e certamente a razão mais importante a meu ver, é que um terço dos nossos deputados na Assembleia da Republica, (cerca de 70) só estão lá em part-time.E o que fazem na outra parte do tempo? A maioria trabalha no privado em grandes escritórios de advogados ou em grandes empresas, muitas das quais multinacionais estrangeiras (refira-se a titulo de exemplo o caso do ex-deputado Pina Moura que trabalhava em simultâneo para a Iberdrola).Ao acumularem estas duas funções, acabam por estar com um pé no sector público e outro no privado.Ou se quisermos, e por outras palavras, são lobistas em “part-time”. Qualquer pessoa terá o bom senso de reconhecer que é natural e humano que defendam no Parlamento os interesses das outras identidades para quem trabalham na outra parte do dia. E refira-se que não estão a cometer qualquer ilegalidade, dado que a constituição prevê essas situações. Isto explica certamente, a razão porque ao fim de uma dezena de anos, a tentar convencer os Grupos Parlamentares, de todos os quadrantes políticos, a discutirem uma possível regulamentação da actividade, sempre encontrei grandes resistências. Por isso enquanto não se impuser um regime de exclusividade para os detentores de cargos políticos na AR, é pouco provável que qualquer medida avance nesse sentido.Agora que se fala tanto numa possível (se bem que improvável) revisão constitucional, creio que a solução do problema poderia passar justamente por ai.Claro que não me refiro a introduzir qualquer menção ao Lóbi no texto da constituição, o que seria absurdo, mas que se alterasse a situação dos nossos deputados eleitos, para que só pudessem exercer os seus cargos em regime de total exclusividade.Acabando-se com os “Deputados-lobistas”, estou seguro que este nosso assunto passaria rapidamente a constar das agendas dos Grupos Parlamentares.Enquanto isso não se verificar só nos resta insistir no que eu e alguns colegas de profissão temos vindo a fazer individualmente nestes últimos tempos. Denunciar a situação, e aproveitar todas as oportunidades para continuar fazer Lóbi pelo Lóbi, para que a palavra assuma  todo o seu verdadeiro significado e que a actividade seja finalmente dignificada.J. Martins LampreiaConsultor / Lobista

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publicado às 18:04

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